A cena se repetiu inúmeras vezes: ao final do dia, um grupo de jovens vestidos de branco trocava o prédio da faculdade por um apartamento nas proximidades, a clínica pelo Play Station, o famoso "motorzinho" pelos joysticks, o flúor pela cerveja, a busca por um sorriso perfeito pelo Winning Eleven.
Como éramos felizes!
Como éramos felizes!
Uma vez por semana, as emocionantes disputas virtuais davam lugar a jogos de verdade. O campeonato estava chegando ao seu final e o nosso time vinha crescendo, com destaque para um jovem franzino e com os dentes completamente desalinhados, que raramente ficava um jogo sem deixar o seu. O cara era um monstro, fazia milagres com a bola nos pés e enchia toda a torcida de orgulho. Recordo-me bem de uma noite, quando extasiado tanto pelo golaço que o craque marcara quanto pela cerveja que bebera, levantei-me do sofá e exclamei:
- Vou poder dizer para os meus filhos que vi esse cara jogar!
Muito tempo se passou desde aquela noite e nem tudo foram sorrisos bonitos nestes onze anos. O jovem craque deixou seu clube de um modo bastante tumultuado e que ainda hoje suscita dúvidas. Mas uma coisa é certa: ele e quem o assessorava em todo o momento tiveram ciência de tudo e foram cruciais para este desfecho. Pouco importa se o que foi feito estava dentro da lei e da legitimidade. O jogador traiu a confiança da torcida, e aqui no interior a gente aprende que confiança é algo difícil de se conquistar mas muito fácil de se perder. Ele foi embora e de um modo que não deixou saudades.
Por isso o meu espanto ao ver sua imagem junto à de outras revelações das categorias de base do clube durante a Convenção Consular de 2009, numa apresentação do projeto para o CT que está sendo construído. Não via seu rosto no estádio desde a final do estadual, nove anos atrás, e não podia acreditar que aquele semblante estava ali novamente. Na hora me dei por conta de que a direção do clube estava tentando se reaproximar de quem se afastara por vontade própria, fato que confirmei pela presença do irmão dele num jogo festivo. Para o meu alívio, a grande e barulhenta maioria da torcida também não queria que ele estivesse lá.
Mas o pior estava por vir: o clube admitiu tratativas para trazê-lo de volta. Mas como assim? E o passado do cara, não dizia nada? Como confiar em alguém como ele? E nem levava em conta o fato dele estar em fim de carreira, sem demonstrar um futebol convincente há muitas temporadas. Era uma questão de orgulho, de não abrir as portas a quem nos desprezou. Manifestei minha contrariedade, assim como muitos o fizeram. Mas para meu espanto, muitos queriam que ele voltasse...
Pois é... como confiar em alguém como ele? Tem um ditado (chinês, creio eu) que diz "se te enganam uma vez, a culpa é de quem te enganou; se te enganam pela segunda vez, a culpa é tua". Todos conheciam com quem estavam lidando. O resultado não me espantou nem um pouco. E fico feliz por isso.
Nesse seu "quase retorno" falou-se até na palavra perdão. Sentimento muito nobre, eu sei, mas mesmo Aquele que disse que devemos perdoar a quem nos tem ofendido nunca dissociou o perdão do arrependimento. E em nenhum momento esse jogador demonstrou estar arrependido pelo o que fez conosco.
Honestidade, caráter, sinceridade, lealdade, respeito... aprendi tudo isso com o meu pai e pretendo ensinar aos filhos que ainda não vieram. E se não posso mais me orgulhar da passagem desta pessoa pelo nosso time, ao menos ele servirá de exemplo de conduta que não quero que meus filhos tenham.
Honestidade, caráter, sinceridade, lealdade, respeito... aprendi tudo isso com o meu pai e pretendo ensinar aos filhos que ainda não vieram. E se não posso mais me orgulhar da passagem desta pessoa pelo nosso time, ao menos ele servirá de exemplo de conduta que não quero que meus filhos tenham.
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